Técnicas de leitura - como ler um livro

Posso dizer que minha vida de leitor até hoje se divide em dois períodos: aquele antes de ler o “How to read a book”, de Mortimer J. Adler e Charles Van Doren, e depois dele.

Na época em que estava lendo este livro, percebia que várias pessoas, quando o viam em minhas mãos, esboçavam um leve sorriso, pois é algo realmente incomum ver alguém lendo um livro de 400 páginas que apenas ensina como ler livros.

Mas isso se deve ao fato de que não sabemos realmente o que é a arte de ler. As pessoas confundem a habilidade de decodificação de símbolos gráficos em símbolos fonéticos com a real habilidade de leitura. Mas ler vai muito além desse passo. Esse é tão somente o primeiro.

Essa obra é considerada um clássico vivo, e teve sua primeira edição na década de 40. Em língua portuguesa ela recebeu o nome de "A arte de ler", mas não se encontra mais facilmente em nossas livrarias.

Mortimer e Charles nos ensinam algumas valiosas técnicas de leitura, das quais tomei algumas notas e compartilho neste espaço. É desnecessário dizer que o tratamento dado na obra a cada um destes tópicos é bem mais profundo, pois o que se segue é apenas uma ficha de leitura que eu anotei em um caderno e usei como base para este post.

Segundo nossos autores, existem 4 níveis de leitura, os quais devem seguir um ao outro:

1) Nível elementar
2) Nível inspecional (ou skimming)
3) Nível analítico
4) Nível sintópico

O nível elementar é aquele nível do qual falamos anteriormente, que consiste em aprender a decodificar símbolos gráficos em símbolos fonéticos. É a habilidade que adquirimos a partir do jardim de infância e desenvolvemos ao longo do ensino fundamental. Ele é a base da leitura, e dele não há muito que dizer.

O nível inspecional tem o objetivo de descobrir se um livro merece uma leitura mais detalhada. Nesse nível de leitura, aconselham Adler e Doren, não se deve ter medo de parecer superficial, pois é assim que devemos ler: superficialmente. Não devemos tentar entender cada palavra ou idéia. Um segunda leitura esclarecerá tudo. Não devemos gastar muito tempo. Ela deve ser rápida. Devemos seguir os seguintes passos:

1) Observar o título do livro e o prefácio
2) Estudar a tabela de conteúdo
3) Verificar o índice
4) Ler a publicação editorial
5) Dar uma olhada nos capítulos que parecem centrais ao argumento do livro
6) Ir folheando as páginas, dando uma “bicada” aqui e ali, lendo um parágrafo ou dois, às vezes várias páginas em seqüência, mas não mais que isso.

Regra importante: Ao ler um livro difícil, nunca pare para entender o que você não entende imediatamente.

A leitura deve ser sempre ativa. Muitos têm a idéia de que a leitura é uma atividade “passiva”, isso é, que a leitura é “receber” informações. Nada mais longe da verdade. A leitura deve ser encarada como uma atividade “ativa”. É um diálogo, é conversar com o autor, fazer perguntas e buscar respostas.

O leitor, para ser exigente, deve fazer sempre as seguintes perguntas a qualquer livro:

1) Do que esse livro trata, no geral?
2) O que está sendo dito em detalhe, e como?
3) Esse livro é verdadeiro, no todo ou em parte?
4) Se sim, e agora? O que vem disso?

O leitor deve fazer também com que um livro seja sempre seu. Um livro não é nosso apenas se o compramos na livraria. Para fazer um livro ser seu, os seguintes passos devem ser observados:

1) Sublinhar
2) Fazer linhas verticais na margem
3) Fazer estrelas ou asteriscos nas margens
4) Fazer números nas margens (seqüência de colocações do autor no argumento)
5) Números de outras páginas na margem (referência cruzada)
6) Circular palavras-chave ou frases
7) Escrever perguntas na margem

Tudo o que foi dito até então se refere ao nível de leitura inspecional. Agora vem o nível mais importante quando se está lendo uma única obra, que é o analítico.

Mortimer e Charles dão as seguintes instruções para este nível de leitura:

1) Saiba que tipo de livro você está lendo, de preferência antes de começar a leitura
2) Sintetize a unidade de todo o livro em uma única frase, ou no máximo em algumas poucas (um pequeno parágrafo)
3) Identifique as partes principais do livro, e mostre como elas estão organizadas no todo, sendo ordenadas umas às outras entre si e à unidade no todo
4) Defina o(s) problema(s) que o autor está tentando resolver
5) Encontre as palavras importantes e tenha certeza de que você e o autor entendem a mesma coisa por elas
6) Marque as frases mais importantes em um livro e descubra as proposições que elas contêm (frases contêm proposições, não se esqueça disso)
7) Conheça os argumentos do autor, encontrando-os ou construindo-os através de seqüências de frases
8) Determine quais problemas o autor resolveu e quais não, e para esses últimos, decida quais o autor sabia que falhou em resolvê-los
9) Você deve dizer, com razoável segurança, “Eu entendo”, antes que possa dizer coisas como: “Eu concordo”, “Eu discordo” ou “Eu suspendo julgamento”
10) Não discorde de forma contenciosa ou apenas por disputar
11) Demonstre que você reconhece a diferença entre conhecimento e mera opinião pessoal apresentando boas razões para qualquer julgamento crítico que fizer
12) Mostre onde o autor está desinformado
13) Mostre onde o autor está mal-informado
14) Mostre onde o autor está sendo ilógico
15) Mostre onde a análise do autor ou seu relato é incompleto

O último nível de leitura eu não vou transcrever aqui. O nível sintópico é um nível em que várias obras são comparadas entre si, e é geralmente utilizado em um processo de pesquisa.

Além disso, há vários capítulos nesta obra de Mortimer e Doren com técnicas específicas a diferentes tipos de literatura, como Romance, Poesia, História, Filosofia, Sociologia, etc. Enfim, é um livro pra se ter na estante e sempre visitar.

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  1. Fico um tempinho sem entrar aqui e quando vejo já tem 3 textos heheh

    Sobre o da educação, comento depois pq vai levar tempo e eu tenho que acordar cedo amanhã (SABE??rs)


    Sobre astrologia, é um assunto que me interessou muito ha uns anos... Mas nem lembro direito como as coisas são calculadas. Nunca li nenhum livro mais aprofundado e tal. Acho que parei depois de um professor d física comentar o assunto. Segundo ele, se a astrologia fala que uma quantidade de massa (de um tal planeta por exemplo) influencia nossa personalidade na hora do nascimento, então a gente deveria levar mais em conta o médico que fez o parto. Levando em consideração a distância, a massa do médico, mesmo bem menor q a do planeta, influenciará mais que a do planeta.


    E 'como ler um livro', bem legal o que vc colocou! Valeu por passar algumas idéias do livro e tal, são úteis. E se não tem o livro em português, não vou ler tão cedo..heheh Falando em grifar os livros, teve que me egurar pra não fazer no livro que vc me emprestou! ehhehe Fiquei com um caderno do ladro a leitura toda pra anotar as coisas rs. A propósito, muito obrigada por me emprestar ele, gostei d+! Vou achar um tempo pra escrever aqui as minhas conclusões sobre ele!

    até amanhã!

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  6. Encontrei esta resenha navegando a partir de blogs de apologética, e descobri que uma edição brasileira recente deste livro foi produzida pela E! Realizações, a mesma editora que publica os livros do filósofo cristão-conservador brasileiro Olavo de Carvalho. Não me parece ser somente coincidência. Pode me dizer se existe algum viés ideológico ou religioso neste livro em particular (pergunto sobre este em particular porque vi que o autor possui outras obras com titulos como "How to think about God", nos quais, acredito, seria dificil NÃO impingir um ponto de vista.)

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  7. Olá, Dalila,

    Quanto a este livro em particular não identifiquei nenhum viés ideológico escancarado. Mas também não procurei nas entrelinhas.

    Este autor, pelo que já ouvi dizer, tem alguns livros em defesa do capitalismo (ou seja, é mesmo conservador, reacionário).

    Não sei se relendo o livro 2 anos depois (pois este post é de 2008) eu identificaria algo que me escapou numa primeira leitura.

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  8. Glauber, Mortimer defende um capitalismo que ainda não existiu, não o capitalismo burguês. O que acontece é que ele foi muito crítico do ensino americano, e como Olavo de Carvalho também é muito crítico do ensino brasileiro, há essa convergência. Mas eles não concordam em política e economia, acho que Olavo, assim como Glauber, não leu "O Manifesto Capitalista" e "Os Novos Capitalistas" de Mortimer Adler e Louis Kelso. Repito: apesar do nome, Adler é socialista+ democrata, mas não socialista+ a favor de ditadura como Glauber (um comunista).

    P.S.: os comentários acima tinham umas correçõezinhas ao post do Glauber, mas eu apaguei porque fiquei irritado com a falta de respostas ou correções do blogueiro.

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  9. "Mortimer defende um capitalismo que não existiu"... e nem existirá, se o que ele defende é diferente do que está aí faz mais de 300 anos.

    E "capitalismo burguês" é um pleonasmo.

    Realmente ainda não li essa obra do Adler, e parece que não terei tempo por agora para ler revisionistas.

    Porque revisionistas, social-democratas e etc descobrindo fórmulas mirabolantes para humanizar o capitalismo temos aos montes por aí, e isso faz muito, muito tempo. Se fosse escolher um, não sei se o Adler seria o melhor deles pra ler primeiro.

    Talvez seja melhor continuar estudando Marx e sua vasta obra econômica antes - coisa que não é fácil e demanda alguns anos. (Suspeito que Adler não tenha feito isso. E se ele é social-democrata, deve ter ignorado até a existência da Rosa Luxemburgo.)

    E realmente defendo a ditadura do proletariado como período de transição do capitalismo ao socialismo.

    "Democracia" no capitalismo é um discurso muito bonito. Um discurso.

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  14. Sobre A ARTE DE LER de Mortimer J. Adler, há uma palestra da editora É Realizações sobre o re-lançamento desse livro, com o novo título "COMO LER LIVROS: um guia clássico para a leitura inteligente". A edição de 1940, da Agir, intitulado "A ARTE DE LER", está disponível na web.
    No apêndice dessas obras Mortimer recomenda a leitura de grandes obras da cultura universal. Entre elas estão a de MARX e LÊNIN, junto com A DEMOCRACIA NA AMÉRICA, de Alex de Tocqueville. Isso dá testemunho a respeito do viés político-ideológico de Adler, que não deve nunca ser confundido com as opiniões de seus leitores. Quanto às "entrelinhas religiosas", Adler insiste na re-valorização do antigo TRIVIUM na pedagogia contemporânea, onde a arte de ler provoca "ansiedade de informação" porque não se sabe mais "pensar" enquanto se tenta interpretar um texto. No prefácio das edições de 1940 e nessa de 2010 os objetivos de Adler estão muito bem explicitados. Uma ex-aluna de Adler, a "irmã" Miriam Joseph resgatou para nossa contemporâneidade o que há de melhor no "trivium", e escreveu "O TRIVIUM: as artes liberais da Lógica, Gramática e Retórica" também lançado pela editora É Realizações, que disponibilizou a palestra de lançamento em seu site. Ambos os livros se complementam e corrigem "A DIDÁTICA MAGNA", de Comenius, no radicalismo das "lições de coisas" desse mestre eslavo, que fez esquecer da "arte de compreender" essas mesmas "lições de coisas", que hoje em dia redundou no bando de analfabetos funcionais que infestam o mundo inteiro!!! Talvez a DIDÁTICA MAGNA tenha sido "mal entendida"...rsrsrsrs...e por isso Adler e Miriam Joseph lutaram pela recuperação do que havia de melhor nas "artes liberais" medievais. O remédio que eles preconizam é a do autodidatismo inteligente (Mortimer também "fugiu" da escola, mas acabou lecionando na Universidade de Colúmbia à convite especial da reitoria).

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