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Mostrando postagens de novembro, 2020

O argumento ontológico de Anselmo de Aosta - uma prova da existência de Deus baseada apenas na razão

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Desde sua primeira elaboração na obra Proslógio (1078), de Anselmo de Aosta, o argumento ontológico para a prova da existência de Deus percorreu uma significativa trajetória na história da filosofia. Descartes, Spinoza e Leibniz o reformularam na modernidade, e Kant, em sua Crítica da razão pura, identificou que todos os outros possíveis tipos de provas da existência de Deus o pressupõem. Novas versões do argumento surgiram também no século XX, destacando-se as de Kurt Gödel e Alvin Plantinga. Durante séculos, o argumento “ontológico” não teve essa denominação. Tanto Anselmo quanto Descartes lhe caracterizavam apenas como meum argumentum – meu argumento. Leibniz fala apenas de um argumentum dudum inter Scolasticos celebre et a Cartesio renovatum – um argumento muito celebrado entre os escolásticos, agora renovado por Descartes. O primeiro a descrever o argumento como ontológico foi Kant. O termo “ontologia”, no entanto, apareceu na história da filosofia cerca de seiscentos anos depoi...

Psicologia do ateísmo - como a psicanálise explica também a descrença em Deus

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Quando falamos sobre religião na psicanálise, a análise está voltada, na maioria das vezes, para investigar os mecanismos psíquicos responsáveis pela origem e pela sustentação da crença em um ser superior. Neste breve artigo queremos apontar que também o ateísmo, ou a descrença em Deus, pode ser explicado pelas mesmas categorias psicanalíticas. Freud identificou que o desamparo infantil seria uma das experiências humanas básicas e universais que responde pela ilusão de que existe um ser superior que protege os homens das forças da natureza. Assim como a criança é protegida do mundo externo por seu pai, o indivíduo adulto é protegido dos males do mundo por um Deus onipotente. Um exemplo de tal análise se encontra no artigo Uma experiência de conversão religiosa , no qual Freud investiga o caso de um homem que se converteu ao cristianismo quando já adulto. Freud recebeu, em 1927, uma carta de um médico norte-americano que havia lido uma entrevista na qual o pai da psicanálise declarava s...

Filosofia e política, de Hannah Arendt - o conflito do filósofo com a pólis

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Filosofia e Política , de Hannah Arendt, constitui a terceira parte de uma palestra sobre os problemas da teoria e da prática após a Revolução Francesa, proferida em 1954. Neste texto Arendt reflete sobre a relação entre filosofia e política desde a Grécia antiga e também considera o papel aí ocupado pelo filósofo. Arendt afirma que o abismo que separa filosofia e política se originou com o julgamento e a condenação de Sócrates. Depois deste traumático fato as duas áreas nunca mais caminharam juntas, fazendo-se uma exceção a Kant. Platão se desiludiu com a política ao constatar que Sócrates não conseguiu convencer nem seus juízes, nem seus amigos. A verdade do filósofo na pólis torna-se apenas mais uma opinião entre opiniões. O filósofo, portanto, se retira da cidade, na qual, a propósito, também não é bem-vindo, ao contrário dos artistas e poetas. Lá ele corre também risco de morrer. Algumas das consequências do julgamento e da condenação de Sócrates para Platão foi seu desprezo ...

Podemos ensinar alguém a ser virtuoso? Sócrates e a virtude no "Mênon", de Platão

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Platão e Atena. Créditos da foto: Glauber Ataide (tirada em Atenas, Grécia, em 29/07/2020) O diálogo Mênon , de Platão, se inicia com o interlocutor de Sócrates perguntando, de maneira abrupta, se a virtude pode ser ensinada. Ao contrário de outros diálogos platônicos, nos quais há toda uma preparação e uma contextualização, este começa diretamente no tema. Sócrates responde que não saberia dizer se a virtude pode ou não ser ensinada, pois ele nem mesmo sabe o que é a virtude. A conversa se volta, então, para um exame do que é a virtude. Mênon tenta explicar a virtude apontando para exemplos, no que é corrigido por Sócrates. Se são várias as virtudes, o que seria aquilo que lhes confere unidade, de modo que todas possam ser chamadas de virtude? Mênon tenta ainda várias outras definições de virtude, mas falha em todas. Ao perceber que estavam em um impasse, Sócrates propõe uma nova forma de tentar responder à questão inicial de Mênon: investigar por hipótese , à maneira dos geômet...