As pessoas mais realistas acompanharam o estabelecimento pela Organização das Nações Unidas, em 2000, das chamadas Metas do Milênio, para combater a pobreza e a fome no mundo até 2015, com uma pergunta: este é um objetivo viável sob o domínio do sistema capitalista?
A cúpula sobre os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio iniciada ontem (20) na sede da ONU, em Nova York, com a presença de representantes de 140 países, é parte da resposta àquela pergunta. Faltam cinco anos para o cumprimento daquele prazo; neste período o mundo assistiu ao auge da hegemonia neoliberal e também ao início de sua derrocada com a grave crise econômica que, com epicentro nos EUA, varreu o mundo e arrasou algumas economias, principalmente as mais ricas e desenvolvidas.
É nesse contexto que o secretário geral da ONU, Ban Ki Moon apresentou um balanço sóbrio, para dizer o mínimo, do cumprimento daquelas metas. Ressaltando que parte do compromisso está sendo cumprido (a luta contra a pobreza) ele lamentou a dificuldade para alcançar os demais (acesso à educação, igualdade de gêneros, a melhoria dos serviços básicos de saúde, luta contra doenças como a Aids e a malária, elevação da qualidade de vida e o respeito ao meio ambiente). Investindo contra a falta de empenho dos países ricos, afirmou que será necessário um financiamento que ultrapassa 100 bilhões de dólares para que as metas sejam cumpridas no prazo.
Mas não vai dar - é o que se depreende da posição de governantes como a alemã Angela Merkel, que foi clara em seu discurso: as metas não serão atingidas, disse ela. O problema, afirmou, não é o dinheiro, mas o que fazer com ele. Enquanto o primeiro ministro da Noruega, Jens Stoltenberg, repetia as palavras de sua colega alemã, o representante do governo dos EUA dizia que o presidente Obama não deve fazer doações para completar o volume de recursos necessários.
No outro extremo, Evo Morales, presidente de um dos países mais pobres do planeta, a Bolívia, foi ao ponto: o fim da pobreza só é possível com a mudança do sistema político e econômico. “Se não mudam as condições nunca poderemos superar a pobreza”, disse, criticando a voracidade dos países ricos em se apropriar dos recursos naturais dos países em desenvolvimento e exigindo o cumprimento do compromisso daqueles países destinarem 0,7% do PIB para implementar aquelas metas. “Não se trata de dar um presente, mas isto é parte da dívida que têm” com os demais países, disse.
O estabelecimento de metas tão ambiciosas quanto aquelas adotadas há uma década ajuda a entender a dinâmica do sistema hegemônico no mundo, o capitalismo, suas limitações e também as ilusões daqueles que as formulam.
O capitalismo é hegemônico há uns três séculos; há cem anos, o imperialismo emergiu e passou a conduzir a expansão planetária desse sistema; há dez anos, o neoliberalismo, carranca mais selvagem e agressiva do domínio do dinheiro, parecia imbatível. Esse desenvolvimento deixou um rastro de pilhagem dos povos, miséria crescente e desorganização da vida em quase todo o planeta. O domínio capitalista aprofundou as desigualdades e a miséria no mundo, sendo a causa e o fator do aumento da pobreza; hoje, em cada grupo de seis seres humanos, um passa fome (925 milhões, segundo a ONU) justamente porque a expansão da produção voltada para o mercado e para a remuneração do capital destruiu suas formas tradicionais de vida. Este é o papel histórico do capitalismo - superar formas rotineiras de produzir e aumentar a produtividade. Mas o passo seguinte só será possível com sua superação e o início de uma nova forma, superior, de organização da vida, da produção e da distribuição da riqueza.
Entretanto, esse patamar civilizatório mais avançado da humanidade não será alcançado nos salões badalados de cidades como Nova York, mas no duro combate dos povos e dos trabalhadores por seus direitos, em busca de uma nova ordem econômica e política que derrote o sistema imperialista e assegure as condições para uma vida digna para todos.
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