Alvin Plantinga - a crença em Deus é básica?


Alvin Plantinga é um filósofo americano, calvinista, bastante cultuado em alguns círculos protestantes por seu trabalho na área da filosofia da religião. Uma de suas mais conhecidas teses é a de que a crença em Deus não precisa de justificação epistêmica por ser uma "crença apropriadamente básica".

Uma crença é definida como "básica" quando ela não precisa se apoiar em nenhuma outra para que se creia nela. Por exemplo, minha crença de que 2 + 2 = 4 não se apóia em nenhuma outra mais básica que ela - eu simplesmente sei que essa proposição é verdadeira.

Assim sendo, Plantinga pretende reduzir a crença em Deus como uma dessas crenças básicas - i.e., ele vai tentar justificar a "verdade calvinista" do "sensus divinitatis".

Para ele, os argumentos da teologia natural para provar a existência de Deus são no mínimo desnecessários, pois além de tudo eles não funcionam.

Mas surge uma questão: o que dizer quando aparecem os chamados "invalidadores", ou seja, argumentos que "minam" a crença em Deus?

Se minha crença em Deus é básica e eu sou confrontado com argumentos racionais que mostram que é pouco provável que Deus exista, minha crença em Deus ainda pode ser considerada como "racional"?

Especificamente, o que dizer das teorias de Freud e Marx que apontam a origem da religião e da idéia de Deus não de um mundo transcendente, mas sim como criação humana?

É justo salientar que as teorias de Freud e Marx sobre a religião não podem provar diretamente a não-existência de Deus (pois é impossível provar a não-existência de qualquer coisa, até mesmo do Papai Noel ou do Coelhinho da Páscoa), mas podem ser invalidadores do argumento de alguns teólogos de que a existência da religião e da idéia de Deus em si apontam para a existência de algum tipo de realidade transcendente.

Argumentos como os de Freud e Marx nunca podem ser tomados de forma isolada, "soltos" no mundo, pois eles estão inseridos dentro de um contexto, de uma determinada cosmovisão. E é assim que eles fornecem coerentes explicações alternativas àquelas cristãs, sendo superiores e preferíveis no quesito de não recorrer à existência de entes desnecessários para explicar os objetos em questão (navalha de Ockham).

Assim, se tomados isoladamente, pode-se talvez considerar que tenham pouca força epistêmica. No entanto, em conjunto com outros invalidadores, eles fazem com que a crença em Deus deixe de ser básica e exija justificação racional, ao contrário do que defende Plantinga.

Pois se analisados em conjunto com outros argumentos, tais como as evidências da evolução natural das espécies e o tipo e a quantidade de mal existente no mundo, eles se tornam uma séria objeção à crença em Deus, forçando o crente a recorrer à boa e velha teologia natural a fim de manter a racionalidade de sua crença, que foi básica apenas enquanto durou sua inocência.



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  1. Interessante.

    No debate entre Craig e Hitchens, o Hitchens perguntou a ele algo como, “Se a crença em Deus é básica, porque vocês se esforçam para criar argumentos e encontrar evidências da existência dele?”. O Craig respondeu algo como, “A crença em Deus é básica, mas se vou apresentá-la a outra pessoa, devo apresentar argumentos para defendê-la”. Então de acordo com ele a Teologia Natural seria, assim, apenas um suporte para a crença que já é básica. Ou seja, apenas uma forma diferente de dizer que “A razão é serva da fé”.

    Quanto a esta questão do marxismo e da psicanálise serem invalidadores da crença em Deus, apesar de nenhum deles garantir a conclusão da inexistência de Deus, eu explicaria isso usando um conceito do próprio Craig. Ele diz que o caso em defesa da cosmovisão cristã é "cumulativo". Isto é, se você tomar apenas o argumento kalam, ou apenas o teleológico, ou apenas o ontológico, ou apenas o do design, ou apenas o moral, ou apenas o da contingência, ou apenas o da ressurreição, você não chegará à mesma conclusão se você analisar todos, progressivamente. Então eu acho que a questão dos invalidadores é também um caso "cumulativo": analisados separados você tem pouca coisa... mas o materialismo econômico, mais as evidências da origem da crença em Deus no desejo, mais as descobertas da biologia evolutiva, mais o problema do mal... tudo vai se cumulando em um invalidador único e forte.

    Eu, particularmente, não acredito na basicalidade da crença em Deus nos moldes de Plantinga. Mesmo porque a epistemologia fundacionalista tem vários problemas. A crença básica cita aqui, por exemplo (2 + 2 = 4) baseia-se em outras crenças, por exemplo, a crença de que existe uma relação entre sua atividade racional e a realidade (é uma crença que, sem ela, não há como dizer que 2 + 2 = 4). Sem contar que a ideia de crenças simplesmente autojustificadas parece contradizer o objetivo da própria epistemologia, que é estudar as justificativas para cada crença apresentada.

    Enfim... é um assunto sobre o qual temos mais perguntas do que repostas. (Graças a Deus! rsrsrs)


    Eliel

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