Dois minutos do ódio
Na obra "1984", de George Orwell, há um estranho "ritual" em que as pessoas são obrigadas a participar diariamente. Ele é chamado de "Dois minutos do ódio", e consiste na exibição, em uma teletela, da imagem e da fala de Emanuel Goldstein, que no livro é o líder exilado da oposição ao governo do Big Brother, juntamente com outros opositores do "Partido" (como é chamado o partido do Big Brother, o Ingsoc).
Durante os "Dois minutos do ódio", as pessoas são levadas a um estado de exaltação histérica, de muita raiva, de ódio, onde proferem insultos e ameaças contra a imagem sendo exibida na teletela. Algumas vezes os telespectadores partem até mesmo para a agressão física contra o aparelho.
Orwell fez com isso uma referência à comum demonização dos inimigos que era utilizada durante a II Guerra Mundial através da mídia. Coisa que não precisamos recorrer aos livros de história para saber como era.
A mídia continua atuando da mesmíssima forma para desestabilizar governos e manipular opiniões. A leitura do panfleto Veja e de outros jornalões do PIG (Partido da Imprensa Golpista) não são nada mais que alguns "minutos do ódio".
Esses veículos não procuram informar, mas formar opinião - coisa de panfleto -, mostrando que deixaram de ser jornalismo há muito tempo. Segundo Diego Cruz, no artigo "Os fantasmas da revista Veja", "...a diferença entre um panfleto e um jornal é que, enquanto o panfleto lança algumas poucas ideias a fim de persuadir, o jornal ou uma revista traz informação, parte da apuração dos fatos, análise e dados, ainda que não possa ser imparcial. Veja, por esse critério, é mais um panfleto que uma revista. E, certamente, não tem nada a ver com jornalismo. "

Eis um exemplo. A exposição de "inimigos" fotografados pelos ângulos mais desfavoráveis com a intenção de provocar desprezo, levar os leitores a um frenesi, juntamente com falas distorcidas ou reproduzidas pela metade, omissão de informações e toda sorte de sujeira para defender interesses que são apresentados com um manto de objetividade.
Orwell foi perfeito em sua metáfora. Nos "Dois minutos do ódio", Goldstein aparecia na tela denunciando a ditadura do "Partido", exigindo o imediato acordo de paz com os países inimigos, exigindo liberdade de expressão, liberdade de imprensa, liberdade de reunião, de pensamento, etc.
Mas à medida que ele falava, o ódio dos telespectadores apenas aumentava. As pessoas pulavam em seus assentos, gritando como animais, com todas as suas forças, numa tentativa de calar a voz que vinha da teletela. E o pior é que sabemos que isso não é apenas ficção.