A gravata como símbolo do pênis
Algumas peças do vestuário humano são indispensáveis, se considerarmos que sua função básica é proteger o corpo contra os extremos do frio e do calor, assim como encobrir decorosamente algumas de suas partes. Outras peças, no entanto, cumprem apenas funções periféricas, acessórias. Vamos analisar brevemente, de uma perspectiva psicanalítica, o uso de uma dessas peças acessórias: a gravata.
Se considerarmos uma calça, por exemplo, verificamos que ela tanto cumpre a função de proteger o corpo do ambiente externo quanto de encobrir algumas de suas partes. Mas alguns acessórios, mesmo que não cumprindo nenhuma dessas funções básicas, são todavia de grande utilidade, como o cinto, por exemplo. Ele cumpre a função de manter a calça suspensa e rente à cintura, e seria impossível a algumas pessoas usar determinadas calças sem o seu auxílio.
Mas algumas peças acessórias, além de não cumprirem nenhuma das funções básicas do vestuário (justamente por serem acessórias), não têm nem mesmo uma utilidade razoável, justificável. Uma instância que podemos apontar é a gravata.
A gravata é uma tira de tecido, estreita e longa, que é usada em volta do pescoço, e amarrada em nó na parte da frente. Mas que função ela cumpre no vestuário? Certamente ela não protege o corpo dos extremos do frio e do calor, e nem mesmo cumpre uma utilidade justificável, como o cinto, por exemplo. O uso da gravata, na verdade, serve hoje a fins meramente estéticos e simbólicos (apesar de ter sido utilizada inicialmente para enxugar o suor do rosto, função esta que historicamente se perdeu).
Símbolos na psicanálise
Um símbolo, grosso modo, é um tipo de representação que remete a uma outra realidade. Se a gravata é um símbolo, a que realidade ela remete? Ela é um símbolo de que? Com qual finalidade?
Quando falamos em símbolos na Psicanálise, estamos falando de símbolos inconscientes. Esses símbolos se manifestam, por exemplo, na cultura popular, em poemas, em mitos, nas religiões, em músicas e, especialmente, nos sonhos.
Freud, em sua obra A interpretação dos sonhos, afirma na seção de representação por símbolos, no capítulo VI, que
"Nos sonhos produzidos por homens, a gravata aparece amiúde como símbolo do pênis. Sem dúvida, isso ocorre não apenas porque as gravatas são objetos longos, pendentes e peculiares aos homens, mas também porque podem ser escolhidas de acordo com o gosto - uma liberdade que, no caso do objeto simbolizado, é proibida pela Natureza."
Mais à frente, em uma nota de rodapé, ele ainda registra um sonho de um paciente em que a gravata aparece como símbolo do pênis.
Mas essa escolha não é arbitrária, e há algumas correlações que podemos apontar entre a representação simbólica do uso da gravata e o pênis enquanto encarnação do Falo.
Por que a gravata é um símbolo do pênis
Em primeiro lugar, como já observado anteriormente, a gravata não tem nenhuma função útil na composição do vestuário. Poderíamos muito bem passar sem ela. Dessa forma, sua finalidade é puramente estética e simbólica.
Em segundo lugar, devemos reparar nas ocasiões em que o uso da gravata se faz socialmente desejável ou mesmo imperativo. Os homens usam gravatas quando querem passar uma impressão de autoridade, respeitabilidade, poder, potência, seriedade, confiabilidade, entre outras coisas.
Em terceiro lugar, tanto o pênis quanto a gravata são objetos que ficam pendurados na parte frontal do corpo masculino. Mas enquanto o pênis é dependurado um pouco abaixo da cintura, a gravata fica dependurada no pescoço. Se a grava fosse usada na altura da cintura, sua semelhança com o pênis ficaria de tal forma evidente que qualquer um reconheceria sua finalidade simbólica. No entanto, ocorre um deslocamento de seu local de uso.
Em quarto lugar, quando nos voltamos para o conceito psicanalítico de Falo, percebemos como fica mais clara a correlação simbólica gravata-pênis.
David E. Zimerman, em sua obra Fundamentos Psicanalíticos, afirma ser "... o falo, na antiguidade greco-romana, a representação simbólica do poder, concentrada no órgão anatômico pênis...".
O psicanalista J. -D. Nasio aponta nessa mesma direção na obra Édipo - o complexo do qual nenhuma criança escapa, quando afirma ser o pênis uma encarnação do "símbolo de potência" do Falo.
O Falo não é uma simples representação peniana. Ele é símbolo de poder, de potência, ou ainda mais: de onipotência. Assim sendo, o pênis, enquanto que uma encarnação, uma representação simbólica do Falo, é uma representação de força, de poder, de autoridade.
O que uma gravata significa
A partir disso podemos compreender que a gravata, pelo fato de ser utilizada em determinadas ocasiões e visando causar determinadas impressões (de autoridade, respeito, força, etc.), que são as mesmas simbolizadas pelo Falo, é uma representação de sua encarnação, a saber, do pênis.
De outra forma, podemos dizer que os homens, por não poderem exibir socialmente seus próprios órgãos genitais, elegem de forma inconsciente um substituto simbólico, em dimensões ampliadas, quando querem demonstrar possuir as características fálicas (de poder, potência, etc.) encarnadas pelo pênis.